Por que a América Latina não ouve a Ucrânia? Чому Латинська Америка не чує Україну? (Португальська, англійська, українська мови)
Recentemente, o presidente do Brasil sugeriu entregar a Crimeia aos russos para acabar com a guerra. O líder brasileiro deveria saber que a Rússia já havia tomado a Crimeia. Sem combates sérios e disparos de armas (com exceção de alguns tiros e um soldado ucraniano morto). No exército ucraniano naquela época, havia uma falta de compreensão do que estava acontecendo. Os militares não conseguiram superar psicologicamente a barreira da "linha vermelha", além da qual começa a abertura de fogo para matar. Não conseguiram vencer a barreira do "gatilho".
Um pouco de história sobre a ocupação da Crimeia pelos russos e as esperanças do "fim da guerra"
Tive a oportunidade de conhecer pessoas que acreditavam que a agressão da Rússia contra a Ucrânia iria parar com a anexação da Crimeia. Assim, essas pessoas repetiram o erro do primeiro-ministro britânico Chamberlain (1937-1940), que acreditava sinceramente que uma concessão a Hitler na forma de ceder à sua demanda entregando a região de Sudetas, pertencente à Tchecoslováquia, à Alemanha impediria a iminente guerra na Europa. Nem esta concessão nem outras o pararam. Bem como a propagação da guerra para outras terras ucranianas após a anexão da Crimeia por Putin. Se o exército ucraniano não tivesse superado a "síndrome do gancho do gatilho" no leste do país, os russos teriam ido primeiro a Kyiv, desarmando unidades do exército ucraniano – da mesma forma que os nazistas foram a Paris, desarmando os franceses. E depois as tropas russas seguiriam para Rava Ruska, uma cidade na fronteira ocidental da Ucrânia. Depois disso, eles anunciariam seu ultimato aos países da OTAN. Afinal, Putin já fez isso, exigindo capitulação da OTAN na forma da rendição de 14 países europeus que aderiram à Aliança depois de 1997. Aquele foi o ultimato para o Ocidente, que não teve consequências porque o exército russo foi detido pelo povo ucraniano e suas forças armadas.
Por que o Brasil não entende a essência da guerra na Europa?
A ingenuidade quase infantil do líder brasileiro não pode ser explicada apenas pelo fato de o Brasil estar longe e, de tal distância, a guerra da Rússia contra a Ucrânia não poder ser vislumbrada em todos os seus detalhes. Além disso, nem tudo pode ser explicado pela parceria do Brasil com a Rússia dentro da associação econômica BRICS. Infelizmente, no Brasil, como na maioria dos países da América Latina, a voz da Ucrânia quase não está ouvida. Em contraparte, prolifera uma poderosa e mentirosa propaganda russa. Em que é baseada?
Desinformação russa: O mito de que Moscou está em guerra com os EUA e todo o bloco da OTAN
Essa mentira russa foi criada para impedir que a própria Rússia entrasse em colapso causado por dentro. Para explicar à sua própria população as numerosas derrotas do famigerado "segundo exército do mundo" russo na Ucrânia. O regime de Putin precisava desse mito para evitar tumultos e protestos que seriam causados pela percepção de que o exército ucraniano estava derrotando os russos no campo de batalha. Com um número muito menor tanto do pessoal quanto das armas. Essa grande mentira, criada por tecnólogos russos, ficou embutida na cabeça da população e cumpriu sua tarefa. Assim sendo, os russos estão orgulhosos de estarem segurando a frente e "roendo" a milímetro as cercas, cruzamentos, porões e outras ruínas da cidade destruída de Bakhmut, com uma população de 73.000, na região de Donetsk. Porque eles estão lutando "não com a Ucrânia. É com a OTAN." Ao mesmo tempo, a liderança e os generais russos entendem que na verdade estão lutando contra o povo ucraniano, não contra os exércitos dos países da OTAN. Eles sabem muito bem que os ucranianos estão batendo o "segundo exército do mundo" com seus antiquados tanques T-64 e caças soviéticos MiG-29 salvados por atuação bem meticulos durante os ataques dos mísseis russos ao país. Os tanques ocidentais modernos prometidos à Ucrânia, estão sendo preparados para transferência passando por necessários estágios da cadeia logística, enquanto a questão dos caças do tipo F-16 ainda é debatida apenas no contexto de uma perspectiva distante. É verdade que a Ucrânia recebe ajuda militar de seus parceiros. Tanto os sistemas de mísseis de alcance limitado e a artilharia são alocados para a Ucrânia literalmente aos poucos. Mas como deixar de mencionar aqui que durante a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética recebeu ajuda militar de parceiros ocidentais em volumes enormes, o que determinou o desfecho da guerra. Isso não a impediu de interpretar a história à sua maneira e, de fato, declarar-se quase o único vencedor.
Os mitos da informação russa funcionam fora da própria Rússia
Portanto, o atual mito russo de que a Rússia está travando a guerra contra"todo o bloco da OTAN" encoraja não apenas os russos, a quem os propagandistas "desenvolveram" a nobre imagem de vítimas e defensores contra a "conspiração mundial" e o mítico "ataque à Rússia." Afinal, os russos estão sujeitos a uma descarada "lavagem cerebral" com interpretação de que "a Rússia foi atacada". E a grande maioria da população acredita nisso. Mas essa mentira também funciona externamente – em países com fortes tradições ditas "antiimperialistas" e antiamericanas. Ao processar ideologicamente, inclusive os países da América Latina, os russos estão alimentando esse mito. Eles levam isso ao ponto do absurdo, criam uma imagem da Rússia como líder na luta contra o colonialismo e a "ditadura" dos EUA e da UE no planeta. É assim que funciona a propaganda russa.
A Rússia como um posto avançado do colonialismo moderno
Ao mesmo tempo, outro fato fica desapercebido no compêndio dos mitos russos: é mesmo a Rússia em sua forma atual que é o principal colonizador do mundo moderno. Traça arbitrariamente linhas no mapa, demarcando os limites de seus "interesses estratégicos". E traspassa à força esses limites caso não receba resistência tangível. Como aconteceu na Crimeia ucraniana em 2014. Na mesma Crimeia, que o presidente do Brasil, Luiz Inácio da Silva, sugere oferecer à Rússia para acabar com a guerra, lembrando a deplorável e vergonhosa atuação de Chamberlain.
Não creio que o líder brasileiro faça tais declarações com intenção maliciosa de prejudicar a Ucrânia. Muito provavelmente, este não é o caso. Ele simplesmente raciocina com outras categorias que não são usadas no Kremlin. Com a ideia ingênua de que qualquer agressão deve parar em algum momento. O importante para isso é ceder algo significativo a Putin. A vulnerabilidade dessas considerações reside em que as concessões ao agressor não levam ao fim da guerra. Tais ações apenas alimentam o apetite, o sentimento da própria grandeza e a necessidade de "derramar o sangue" de outras nações em nome do próprio império. Ao dar uma explicação para sua própria congregação sobre a "sacralidade" deste crime, os padres da igreja ortodoxa russa estão batizando e abençoando zelosamente os soldados do exército russo para assassinarem os cidadãos da Ucrânia e para destruirem a infraestrutura do pais.
Conclusão:
A ocupação de territórios alheios não detém a Rússia moderna, sendo isso confirmado pela guerra que ela vem travando os últimos nove anos na Ucrânia. Países e líderes que geram ideias que ressoam com as demandas do Kremlin caem na armadilha das insidiosas narrativas russas. Que servem de justificativas para a guerra, ocupação de territórios e violação das fronteiras de países soberanos, disfarçadas sob a retórica "pacificadora". O leitor se lembra do constrangimento na conferência em Delhi, no início de março último, quando o público caiu na gargalhada em resposta às colocações do chanceler russo Sergei Lavrov de que "a Rússia está tentando parar esta guerra"? Os propagandistas russos, aliás, cortaram o som dessa reação nos noticiários russos. Rir, claro, é bom, mas não nas condições de uma guerra em que as pessoas são mortas pelo desejo de viver em seu próprio país, e não em uma colônia russa.
A América do Sul precisa ouvir também a voz da Ucrânia. A diplomacia ucraniana deve trabalhar ativamente no exterior, realizar reuniões e eventos para informar sobre a política predatória e bárbara do Kremlin, sobre as consequências da invasão russa da Ucrânia. Se os políticos latino-americanos não têm pressa em visitar a Ucrânia, devemos incentivá-los a fazê-lo e levá-los pelas ruas de Bucha, Irpinh, Izyum e outras cidades desfiguradas pela invasão russa, cidades que tornaram-se palco de massacres de população civil (https://www.facebook.com/watch/?v=1042193739801583). Nem que seja virtual. Há que levar exposições fotográficas para seus paises e organizar projeção de documentários. E é importante que um Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da Ucrânia assuma suas funções no Brasil, que trabalhe com dedicação, organizando eventos ilustrativos com envolvimento da comunidade ucraniana no Brasil. Isso contribuirá para entendimento e atitude mais realistas neste país em relação à guerra desencadeada pela Rússia.
Original source: "Kyiv Post", and version in English
Першоджерело: "Кyiv Post", й версія українською мовою
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